kate middleton, série do marido enganador e nara smith: o futuro do TikTok está no rabbit holes
Inclusive o futuro das marcas, tá? E o próprio TikTok defende os buracos de coelho no seu relatório de tendências para 2024.
A página principal do app já diz tudo: a For You é de fato feita para você — com os seus gostos e o que você quer ver. Ela é guiada por um algoritmo quase mágico, que parece captar o seu inconsciente e que, no momento que entende o seu cérebro, boom: cria o seu próprio nicho.
De cara, o TikTok deixa uma mensagem bem clara: somos uma rede que pensa para e por meio de nichos — aliás, micro-super-micro nichos. É uma curadoria que chega a um nível de particularidade literalmente pessoal, na qual só você vê aquela combinação de conteúdos, um mix montado a partir de fragmentos de vários tópicos da plataforma.
Mas o que acontece quando, de repente, você decide dar mais uma pesquisada naquela teoria doida que apareceu há 10 scrolladas atrás? Ou assistir à parte 2, 3 e 4 da história que surgiu na sua For You? É aí que entram os buracos de coelho.
Em 2015, a escritora Kathryn Schulz, do The New Yorker definiu: “quando falamos sobre buracos de coelho, queremos dizer que ficamos interessados em algo ao ponto de nos distrairmos, geralmente por acidente, e muitas vezes à um grau que o assunto em questão nem mereceria.” Ao meu ver, existem duas coisas que caracterizam o buraco de coelho:
a surpresa: você não imaginava que aquele buraco estaria ali, ou pelo menos não sabia que ele seria tão grande ou tão interessante.
o cair: e, quando você cai, você cai, cai e cai… A distração extrema que Schulz menciona, quase uma abstração que te hipnotiza, e da qual é bem difícil sair.
Scrollar no TikTok é, diariamente, cair nos rabbit holes que o app nos apresenta. Entrar nos micro nichos, descobrir uma piada que só um grupo entende, achar o seu assunto, cair no buraco do coelho e dele não sair mais.
Já ouviu falar dos edits do Chico Moedas ou as palavras “eu tentei!” não significam nada pra você? Porque o tema já tem mais de 59M de visualizações e tem até playlist para se sentir em um vídeo do aquariano nato. E a história de mais de 50 partes sobre o marido que enganou a esposa por anos, contada pela própria? Sim, eu estou falando de mais de 8 horas de conteúdo sobre uma mesma história, e a Gen Z, a dita geração da ansiedade e da rapidez, assistiu tudinho (para os millennials também ansiosos, a Rolling Stones resumiu). E o Kate Gate, garota, já viu todos os resumos & fotos comparativas & teorias da conspiração & atualizações do palácio real? Aqui, em ordem cronológica para você entender.
Deu FOMO? Então, você está pronto pro próximo tópico:
Você já deve estar sentindo na pele o 1º motivo: o desejo por pertencimento. A vontade de estar por dentro, fazer parte de um grupo, a satisfação pessoal que obtemos quando só nós — e a nossa pequenina aldeia global de alguns milhões de pessoas — entendemos aquela piada.
Desse motivo, surge um 2º, descrito pelo estudo da Consumoteca sobre a Gen Z como “o desejo por conceito.” A Gen Z quer agregar conceito à sua personalidade, quer ter uma rotina aesthetic, uma imagem cool, mostrar o seu POV sobre o mundo — e, de forma contraditória, ver e se identificar com outros POVs parecidos com o seu.
Pertencimento e a identidade andam lado a lado e se materializam após o consumo desses rabbit holes. Mas o que vem antes do cair, o que te atrai para dar uma olhadinha naquele buraco e acabar tropeçando? Vamos ao 3º ponto: a era em que o conteúdo é rei. O TikTok sempre se propôs a ser não uma rede social, mas uma plataforma de entretenimento. Esqueça o rolê dos amigos nos stories: o desejo hoje é por assuntos que interessem e histórias que prendam.
E por que a vontade de estar preso no TikTok? O 4º ponto é descrito pela Consumoteca como “desejo por escape”, outra faceta do behaviorismo Gen Z: uma geração que busca produtividade e sucesso, mas que é ansiosa, se compara o tempo todo, tudo enquanto é esmagada pela realidade das guerras e do colapso ambiental. Para liberar essa tensão, é preciso uma dose extra de escapismo diário.
O que nos leva ao último ponto: não dá pra escapar com um episódio por semana, como eram as séries nos anos 2000. Não dura. No livro “Three uses of the knife”, sobre processos artísticos, David Mamet discorre: “as pessoas são atraídas para os filmes de verão porque eles não são satisfatórios, então, eles oferecem oportunidades para repetir a compulsão.” Ou seja, já ultrapassamos o binge-watching e estamos na era do endless scrolling: precisamos de infinitos rabbit holes, um atrás do outro, para suprir tamanha necessidade de dopamina.
Dark? Talvez.
Mas junte um app que te entrega tudo isso de bandeja e você verá a mecânica dos rabbit holes delineada na sua frente: o TikTok te apresenta uma variedade de conteúdos que te entretém, organizados em uma curadoria projetada para os seus interesses. Logicamente, te dá vontade de olhar para dentro de cada um desses buracos. E, quando você tropeça, não só recebe mais e mais conteúdo interessante, o suficiente para escapar por quanto tempo quiser, como esse delicioso cair ainda traz uma sensação de pertencimento a um grupo e uma identidade recheada de conceito e aestheticness. Delícia, né? Na próxima vez, sabe o que acontece? Você pula de cabeça.
Se as marcas podem explorar esse ambiente caótico e diverso dos rabbit holes? Devem! E quem diz isso não sou eu, é o próprio TikTok no seu report de tendências para o ano, o What’s Next 2024: “O seu objetivo (como marca) é liderá-los para o próximo buraco de coelho.” Calma, calma, vamos por partes:
Antes de pensar em criar o próximo buraco de coelho, é importante entrar na mentalidade dos rabbit holes: você não precisa ser tudo para todo mundo, você precisa ser muito pra alguém. Entenda que você está em uma rede social movida por super-nichos, então mergulhe nas comunidades com as quais o seu público já engaja e produza conteúdos mimetizando o que ela já produz, isto é, que conte as mesmas piadas e fale a mesma língua.
Não buscando vender, mas pensando, antes disso, em criar conexão com essa comunidade, mostrar que você também pertence a ela, que tem algo a contribuir — e não, não é o seu produto.
*segredo: ninguém está nem aí para o seu produto. O usuário do TikTok quer saber o que você adiciona na engrenagem algorítmica dele, que já roda muito bem sozinha, obrigado.
Mestre nisso é o @duolingobrasil. O conteúdo que ele entrega não é feito para que o usuário saia do TikTok e abra um app de aula de linguagem.
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Aprenda uma coisa: o usuário não vai sair do TikTok. E você não está lá para tentar tirá-lo, mas sim para mostrar para ele que você também está dentro dos rabbit holes que ele está, que entende das mesmas piadas e que posta o que ele quer ver, fazendo com que ele se identifique com você. E que te ache cool & aesthetic & agregador de conceito para a sua identidade e queira te inserir na sua rotina — e aí sim ele vai atrás do seu produto.
A cartada final? The duolingo rabbit hole. A marca se tornou tão icônica com seu humor irreverente, seu entendimento profundo dos formatos da plataforma, que criou o seu próprio rabbit hole, o seu próprio nicho. Todo mundo ama o Duo no TikTok, e todo mundo quer participar da comunidade de pessoas que amam o Duo. É o sonho, né não? Pensando em exemplos menos cômicos e mais fashion e beauty, temos a E.l.f cosmetics, sucesso com a sua comunidade de maquiagem, e a brasileira Makai Bikini, totalmente amada pelas babes.
Nem toda marca irá chegar nesse ponto, mas ela pode sim, como sugere o TikTok, liderar a sua comunidade para o próximo rabbit hole ou, em outras palavras, o próximo assunto sobre o qual todos vão ficar obcecados. Seria esse assunto uma informação nova, como o cabelo da Taylor Swift no Brasil? Ou uma estética que se torna viral e motivo de desejo tão forte que a própria marca vira desejo também? Ou, quando a sua marca já for forte o suficiente, um produto que vira a mais simples expressão de coolness das girlies do TikTok?
É esse racional que o TikTok What’s Next 2024 recomenda: não tentar de cara empurrar um produto para o consumidor. O seu público tem que se tornar o seu bestie antes de se tornar um comprador da sua marca. E, para isso, você precisa ter a coragem de criar como ele cria — é a “creative bravery” que o report descreve.
Pule nos rabbit holes junto com eles, remixe narrativas, responda, adapte, interaja como ele interage. É isso que constrói confiança.
Um amigo que está no SXSW, um dos maiores eventos sobre inovação e comunicação no mundo, disse que só se fala sobre 2024 ser o ano da construção de comunidade. Todas as marcas estão tentando desesperadamente encontrar os seus lugares na mesa — sem saber que, para se conectar com a sua comunidade, você só precisa buscar ser como ela já é.
A resposta, quando se fala de TikTok, está nos rabbit holes. Claro, entendendo quais conversas fazem sentido para a sua marca e sempre se guiando por onde o seu público já está. Só entrando de vez na lógica dos super-nichos a ponto de cair junto quando a sua audiência pula em um deles, você consegue de fato dar as mãos para a sua comunidade — e, quem sabe, ter fôlego suficiente para liderá-los para o próximo buraco de coelho. Boa sorte :)
OOO 3 RABBIT HOLES QUE VOCÊ PRECISA ENTRAR PARA ENTENDER SOBRE RABBIT HOLES (NO TIKTOK, LÓGICO)
O Essas reflexões da dona da Makai Bikini sobre criação de comunidade e as táticas de ~guerrilha que a marca usa para construir nesse sentido.
O Essa playlist “Niche” que conta polêmicas que estão rolando em rabbit holes do TikTok que você provavelmente não está (como a comunidade de bird watchers).
O Esse TikTok que explica sobre um rabbit hole que foi fabricado pela comunidade — e, de quebra, ainda traz aprendizados sobre o report TikTok What’s Next 2024.
Desde que você recebeu a nossa última newsletter, nós seguimos online. Esses foram os principais posts da OUT OF OFFICE, caso você tenha perdido:
Muito bom como vcs definiram o funcionamento dessa rede viciante - e eu falo como consumidora assídua haha. Uma outra pessoa que eu acho que faz isso muito bem é o Dr Miami, com a Santina (que é quem faz o social media dele), ele participa de varias trends e no perfil dela sempre tem o backstage deles gravando, criando também o próprio rabbit hole/narrativa deles que é da Santina ser uma gen z “tirana”, acho sensacional a forma como eles amarram tudo e criam esse rabbit hole que já é enorme.
Eu amo como vocês são cirúrgicos nos comentários ✨🤝✨