a era dos fragmentos: como creators e marcas podem integrar nichos e criar estilos de vida
Será que precisamos consumir no formato "colcha de retalhos"?
Você decidiu que quer começar a correr. Segue um perfil nichado em corrida e, em uma semana, consome todos os conteúdos possíveis sobre o assunto. O perfil já entregou o que você queria de informação. Afinal, todo dia tem seguidor novo e, de tempos em tempos, os mesmos conteúdos são repetidos.
Então, você para de seguir. Não tem mais nada além do nicho.
Os conteúdos de lifestyle são a premissa básica de qualquer marca, influencer e creator que se estabeleça dentro de um contexto de social media. Onde eles estão quando a lógica do sucesso começou a girar em torno da nichização?
Você decidiu que quer começar a correr. E então tem o algoritmo.
O algoritmo do TikTok.
Ele rapidamente entende que você agora quer começar a correr. Essa pequena mudança na leitura do seu perfil faz com que você seja bombardeado com conteúdos desse mesmo nicho. À medida que você acompanha cada vez mais esse território, algumas personalidades se destacam mais na sua mente. E então, você cria seu próprio podium de fandoms.
Contudo, além de corrida, você também é fã de outros nichos, como receitas de massas italianas e moda. Esses interesses são entregues diariamente enquanto você rola a tela. Novos fragmentos, criados por diferentes criadores de conteúdo, formam um quebra-cabeça maior: "o grande moodboard da sua vida — composto por nichos de interesse, entregues por criadores diretamente para você — todos os dias, a toda hora, a cada segundo".
A era fragmentada nos força a coletar e explorar diversos nichos que, juntos, formam nossa personalidade. Mas será que não existe uma maneira de unificar nossos interesses, personalidade e comportamentos de forma mais simplificada?
Precisamos realmente consumir informações no formato de uma "colcha de retalhos"?
Os seres humanos têm uma longa história de seguir líderes, motivados pela necessidade e aspiração. Com o crescimento dos nichos e o sucesso do conteúdo digital sendo enclausurado por eles, essa liderança se fragmentou, manifestando-se em diversas formas e contextos, como referências no esporte, na profissão e etc. Hoje, buscamos aspirações fragmentadas para cada tipo de situação e meta que desejamos alcançar na vida, aderindo a comunidades nichadas, subculturas e fandoms específicos.
O filósofo francês Frederic Laloux discute a tendência da nossa sociedade de viver em silos que se "desorganizam" para abrir espaço a lideranças contextuais, que mudam conforme o tempo e a necessidade. Essa lógica pode ser aplicada a nós mesmos: nossos silos de consumo de conteúdo mudam e se transformam conforme quem somos naquele momento. Ao juntar cada fragmento de conteúdo e nicho, formamos nossa identidade. E a tecnologia facilita esse processo, gerenciando o acesso a micro nichos.
para ler e se aprofundar sobre o impacto do contexto nos silos: Reinventando Organizações de Frederic Laloux
Esse fenômeno é ainda mais amplificado em um mundo regido pela creator economy. Segundo Seth Godin, em "Tribos", o sucesso está ligado à capacidade de liderar nichos específicos da sociedade, o que pode causar mudanças drásticas ou sutis na forma como nos organizamos como seres humanos. Se antes o poder estava na escalabilidade da indústria e na comunicação em massa das TVs, hoje está na liderança exercida por cada um de nós através da comunicação digital — só que alguns se destacam mais e moldam de maneira influente como vivemos.
Recentemente, tivemos um grande boom dos nichos. O que impulsionou essa tendência e por que a fórmula de sucesso do conteúdo digital atual depende tanto de se estabelecer de forma consolidada em um nicho específico?
A resposta está logo ali. De maneira fria e calculista: diante daquilo que dará mais retorno. Criadores de conteúdo buscam sucesso no algoritmo, e as plataformas incentivam diretamente que esses criadores atendam comunidades específicas com conteúdo de qualidade. O que vemos é que a produção em massa de conteúdo sobre o mesmo assunto, dia após dia, é eficaz. É uma maneira prática de ensinar ao algoritmo quem é a sua audiência: nichando-a. Produzindo apenas o mesmo tipo de conteúdo, a fórmula parece perfeita: faça 10 conteúdos por dia sobre o mesmo tema e atinja a audiência ideal. Mas a regra é clara: fale de outra coisa e veja seu engajamento cair.
Contudo, a cultura do marketing fragmentado também tem seus limites. Os assuntos se esgotam, as novidades se tornam repetitivas, e surge a pergunta: o que, no final das contas, fará com que você se diferencie de outros criadores de conteúdo do mesmo nicho?
A resposta pode estar na autenticidade e inovação dentro do próprio nicho. Enquanto muitos criadores seguem a fórmula rígida, aqueles que conseguem trazer perspectivas únicas, histórias pessoais e abordagens criativas conseguem se destacar. A saturação no conteúdo nichado força os criadores a serem mais criativos e a buscar maneiras de renovar seu conteúdo, mantendo a relevância e a conexão com seu público.
Enquanto repetirmos o mesmo formato todos os dias só porque ele dá certo, não encaramos com o melhor da vida: a intuição criativa humana.
Bingo! A chave para o sucesso no nicho está em diversificar, juntando mais peças desse fragmento para criar uma plataforma de lifestyle. E há outro fator relevante a ser considerado: os fandoms.
Na perspectiva de uma marca, a construção de loyalty, que diminui o custo de aquisição de clientes, está profundamente ligada à maneira como o consumidor ambiciona algo que melhorará sua vida. Seja de maneira tangível ou intangível, a conexão emocional está na forma como amarramos conteúdos digitais a estilos de vida.
Conseguimos transpor a mesma lógica para influenciadores. Caso há ambição de crescer:
Entenda que seu nicho pode se tornar um teto para a aquisição de seguidores e a expansão da sua comunidade.
Sua comunidade, ao crescer, quer saber mais sobre você: quem você é por trás das telas, suas ambições, sua vida.
O nicho pode aprisionar sua produção de conteúdo devido à saturação de tópicos.
Portanto, diversificar o conteúdo é uma consequência quase inevitável do crescimento de um creator. No final das contas, as pessoas querem consumir e fazer parte de fandoms que enxerguem o "todo" — vários fragmentos de si mesmas em um estilo de vida ou, melhor ainda, vários fragmentos do estilo de vida que gostariam de ter.
Somos seres faltantes, movidos pelo que não temos.
Para a Geração Z e os Zillennials, esse fator é ainda mais representativo. Segundo o report da Vice (clique aqui para baixar e ler), para esses grupos, a felicidade está em pequenos momentos, fragmentos do dia, e o compartilhamento desses momentos rege a vida com um olhar mais micro, mais próximo de nossas rotinas e prazeres diários.
Dentro de um ecossistema fragmentado, as pessoas buscam pela totalidade. E o papel das marcas e influenciadores é juntar essas peças e abraçar um DNA de lifestyle. O problema é que ainda há pouco discernimento do que constitui esse todo para deslanchar uma estratégia de conteúdo digital que aborde esse posicionamento mais "360".
Aqui jaz um convite para creators e marketeiros: recolham-se para entender quais fragmentos fazem parte do DNA que desejam construir para suas marcas. Não se prendam ao seu nicho. Personifiquem ou, melhor ainda, diversifiquem.
Lembrem-se de que quem está do outro lado é uma pessoa que não faz apenas uma coisa ao dia, mas sofre interferência de inúmeras atividades, interações e deslumbres diariamente.
As marcas serão as facilitadoras na comunicação entre fandoms e comunidades. Quais nichos e segmentos de conteúdo fazem sentido aglutinar para que se atinja esse DNA total de lifestyle? É necessário que as marcas se tornem plataformas de conteúdo que agreguem certos tipos, formatos e nichos específicos de criadores, entregando à sua base de fãs algo que seja característico de um lifestyle vendido.
As perguntas são inúmeras, mas vale recapitular os comportamentos e histórias dos seres humanos que nos levaram ao patamar atual de consumo de conteúdo digital, para reavaliar e entender o novo paradigma emergente.
Vamos voltar para o seu celular, mais especificamente para o TikTok e a seção For You. Que tipo de conteúdo você consome ali? Lembra da criadora de conteúdo sobre corrida que você seguia em 2021? Ela continua com o mesmo tema? O que você percebe que mudou ao acompanhar seu crescimento no nicho?
O exercício é sempre diário. E as mudanças e os movimentos do mundo também.
OOO 3 CASES DE MARCAS QUE AGLUTINARAM DIVERSOS SEGMENTOS PARA COMPOR O SEU DNA TOTAL DE LIFESTYLE
O Essa forma da Misci combinar cultura, moda e referências populares de várias frentes.
O Esse projeto de clube do livro pela Zerezes que fortalece ainda mais o território de cultura da marca.
O Essa construção de fandom da Lululemon em torno da ideia de ter um lifestyle saudável e ativo.
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ufa! que aula